terça-feira, 13 de julho de 2010

Um dia conta muito

Ela se levanta. Trinta e dois pras oito da manhã. Paralisada em seu sonho essa hora está. Hora de preencher mais uma fileira de impressões da vida. Dormiu no sofá de tanto pensar nelas.Quinze passos para chegar à cozinha. Frita seus ovos com bacon, folheia o jornal. É mais uma fria manhã em Nova Iorque. Trinta passos pra porta, mais treze pra chegar à escada. Vinte e seis degraus acima, e mais sete passos,seu quarto.Conta cada passo.
Ela deixa o quarto. Sete à frente, vinte e seis abaixo, conta seus passos que a levam aos lugares, mas não os dentro deles. A sala está desorganizada. É escritora,e pesquisa por três horas pra chegar ao conto de hoje. Conta suas histórias, depois de contar seus passos. Passa por mais uma hora pra escrever duas páginas.
Ela sai de casa. Cinco à frente,dois à esquerda. Toma um taxi. Chega ao restaurante, almoça com os amigos, sorri apenas duas vezes. Tomam-se duas horas para arrancar dois sorrisos dela. Sai do restaurante, trinta e cinco passos depois. Oito à frente, três à direita. Toma um novo taxi. Vai à editora entregar seu conto.Quarenta e oito degraus e dez passos depois, contam pra ela que a crítica desta semana é excelente.
Ela deixa de estar depressiva, e depreciada. Sorri pela terceira vez no dia, o que não acontece há meses. De tanto contar sem somar nada, achava que seus dias estavam contados. Todos morremos jovens quando morremos em nós mesmos.
Ela volta pra casa, esquece de contar os passos. Substitui a contagem compulsiva pra escrever compulsivamente, pra todos os seus amigos e família. A fileira dos dias tristes está preenchida, e dá lugar à dos dias felizes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário